quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Só por hoje

Hoje o maravilhoso azul do céu riu de mim, que acordei como a velha Beatriz. Não foi de propósito e muito menos definitivo, mas pus os pés no chão e me senti ridícula. Um choque de realidade que pende mais pro pessimismo me atingiu a boca do estômago. Foi como se a insegurança, que andava desaparecida, tivesse finalmente achado um espaço pra me invadir e dizer que estou sendo patética. De repente pensei: ''o que diabos eu estou fazendo?'', e saí de cara amarrada marchando rumo ao sol. Sol este que me cumprimentou sarcástico e perguntou se não ia admirá-lo como tenho feito diariamente. Disse que não, e continuei caminhando com firmeza. Meu eu ranzinza acordou querendo espaço, tirando as músicas bonitinhas da playlist, prendendo o meu cabelo o mais alto que pode e vestindo as botas mais rígidas que encontrou. Acordei querendo varrer tudo aquilo do pensamento, pra encontrar de novo a minha concentração e o foco no que deixei de lado.
Não consegui, é claro, mas foi bom pra respirar. Me livrei do tédio e finalmente minha cabeça pode trabalhar com os meus cálculos e números sem voar pra longe nenhuma vez. Hoje a Beatriz prática, chata, objetiva, fria, impaciente e irritada tomou as rédeas. Confesso que estava com saudade. Ficar neste estado suspenso de felicidade e distração dá muito trabalho. Mas enfim, foi só por hoje. Amanhã eu já não garanto não estar coberta de florais, cantarolando e elogiando o verde das folhas das árvores...

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Pensamento ll

Fez um calor infernal e lá estava você de blusa com mangas três-quartos, calça jeans e tênis. Sei que já está ficando repetitivo reclamar da sua roupa, mas você também não coopera. Aí eu te pergunto "onde anda com a cabeça?'' e você responde que não sabe, ensaiando falar sem parecer imbecil, porém o sorriso escancarado deixa claro. Neste sol você saiu com a roupa errada, de novo, e no caminho lembrou-se de me perguntar por que tanta burrice.
Nem olhe pra mim, isso é tudo culpa sua.
E o amor não chegou batendo na porta com socos e pontapés, como se imaginava. Sem escândalo, sem aviso, sem cerimônia. Não fez barulho algum, esperto que é. Talvez não quisesse me assustar. Colocou sua mão de leve e foi empurrando a barreira, vindo de mansinho, com passos curtos porém ritmados e silenciosos, até não sobrar mais nada. Quando vi ele já estava aqui. Visita inesperada! Mas a essa hora...
Olhei pra ele e pensei: e agora? Ele me respondeu que tudo o que tenho que fazer é não fazer nada. Tudo bem, eu é que não me atrevo a dizer o contrário. Até porque, com ele não se discute, você sabe.

Pela janela

Três ônibus. Coletividade. Lado a lado.
Um levava da cidadezinha à capital. Bancos desconfortáveis, sol batendo inoportuno na janela, transformando o retangular móvel num forno particular. Gente, gente por todos os lados se amontoando. Caras amarradas com o nó da rotina. Poucos sorrisos espalhados pelo vento que entrava da janela. Trabalhadores e estudantes lutando por um espaço: No mundo, em pé entre os canos, nos assentos. Sonhos, gás, apatia, conformismo, cansaço, ânimo, falta, motivação, balançando aos solavancos pela rua castigada de buracos.
Pela janela.
Ao lado, um imponente ônibus executivo de viagem que trazia na lateral as letras de sua arrogante superioridade: ''ar condicionado'', ''wi-fi'', dizia, exibicionista. Em seu interior pessoas do alto de sua elegância, sérias, compenetradas, empenhadas em não perder a conferência. Olhos amarrados no relógio, sorrisos congelados pelo frio artificial. Os movimentos são suaves e os corpos se entediam. Eletrônicos nas mãos. O sol não entra, há uma barreira escura na janela.
Pela janela.
Em seguida, um sofrido transporte de presidiários. Sua carcaça velha grita o descaso. A ferrugem corrói por dentro e por fora. A poeira já se encontra impregnada. No interior, homens e suas marcas. Suor, vingança, tristeza, saudade, desespero. O sol que vem parece diferente, o vento é abafado. O mundo não mudou, ainda há vida. O balanço é pouco sentido. Há o vislumbre das árvores porém os pés não tocam a terra. Corpo febril, ódio, arrependimento. Será que vale a pena olhar?
Pela janela.
Os três lado a lado. Suas janelas quase se encostam mas não se misturam.
O mundo é tão móvel. Nessas mudanças da vida as coisas se embaralham .
Trabalhadores e estudantes na cadeia, arrogância do dia-a-dia e a prisão da alma em meio ao luxo.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Fica comigo. Por uma semana, o resto da vida, ou uma noite. Só senta do meu lado pra gente ver aquele canal que você gosta e discutir pra onde vamos viajar. Põe a sua mão na minha, não fala nada. Vamos rir da cara um do outro, rir de doer a barriga. Juntos, sem parar pra tomar fôlego. Vem me divertir, me descobrir, me cobrir de olhares. Deixa eu te ver sendo bobo, fazendo gentilezas. Me proteja como você sempre faz. Traz nossas metas pra gente realizar. Sonharemos outras. Me explica por que tô me sentindo assim. Me mostra de novo como eu fico eufórica ao te ver. E fica. Até você cansar de mim. Até eu te prender de vez. Até os dias se acabarem. Pra eu não sentir mais essa sua falta. Não vai mais embora, não.

domingo, 17 de fevereiro de 2013

Pensamento

Saio de casa. Fecho o portão atrás de mim. Desço a rua.

Mas que droga eu nunca fui tão relaxada pra me vestir. Por que não me arrumei mais? Jeans, camiseta e tênis, francamente. Só uso isso, também. E essa bolsa batendo na minha perna sem parar? Saco. Que dia lindo, que calor. Por que raios eu vim de calça? Por que não uma saia? Aonde eu tava com a cabeça? Estou quase sem maquiagem e não lavei o cabelo. Desleixo! Minha mãe tem razão, sempre teve. Sou largada demais. Com tantos vestidos no guarda-roupa, tenha dó. Será que vai chover? É claro que vai chover. Será que ele já está lá? Deve estar, tô atrasada. Droga. E se não estiver? Pois é, e se ele não estiver?
Deixa eu ver, hmmm... Tá sim. Olha ele ali, no banco. Devia ter me arrumado direito, mas que droga!
Ele me viu, tá sorrindo. Que sorriso bonito. Como é que eu vou cumprimentá-lo? Ai-meu-senhor! Será que eu dev...

Beijo.

- Oi.

Sorriso.

- Oi.

Silêncio. Calma. Paz.
Meu pensamento se apaixonou e, aleluia, finalmente calou a boca.

Eu e minhas obviedades

Sou tão óbvia que me irrito fácil, fácil, com o meu comportamento. Me movimento na cadeira sem parar, balançando as pernas num ritmo frenético como se fosse dar a partida e nunca mais voltar. Pelo contrário, não saio de onde estou, sempre girando em meu próprio eixo. Mas a cabeça... voa tão longe que demora horas pra regressar ao corpo. Sou tão óbvia em meus passos, nos caminhos que escolho, sempre andando do mesmo lado da calçada. Deixo transparecer tão fácil... Basta um piscar de olhos e lá estou entregando com um floreio o que um dia jurei proteger. Nunca tive medo. Pra isso, não. O que inclusive é bem engraçado. E não faço por mal, veja bem. É que não tenho controle. E pra quê ter, eu me pergunto, pra quê ter? A vida é um espacinho tão apertado, que quando a gente assusta já passou. Vou me conter pra quê? Pra evitar o quê? Querendo ou não, vou cair, ralar os cotovelos, chorar baixinho de madrugada. Dando certo ou não. Sendo assim continuarei sendo ridiculamente óbvia, sem reservas. Me denunciando o tempo todo, deixando escapar os meus sussurros. Tamborilando os dedos na mesa sem parar, sentindo o comichão de ser eu. Assim, bem irreparavelmente óbvia.

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